quinta-feira, 25 de janeiro de 2018

Café Royal LVI

Pontes

O distanciamento entre Madeira e Açores é tanto geográfico como histórico. Mas, paradoxalmente, os contactos entre os dois arquipélagos foram sempre muitos e variados, começando mesmo no dealbar do seu povoamento. Primeiramente habitada, é na ilha da Madeira que terão origem algumas das primeiras capitanias açorianas, da mesma forma que ao longo dos séculos foram os Açores o celeiro da Madeira. No entanto, a característica fundamental da relação entre os dois arquipélagos é a disputa entre si pela afirmação de cada um aos olhos da metrópole. Podemos até dizer que é esse, ainda hoje, o ponto primeiro do diálogo entre estas duas realidades arquipelágicas. Porém, à luz dos novos tempos, indica-nos a razão ser urgente a construção de pontes sólidas entre estas duas latitudes, há tanto desavindas. Pontes na mobilidade aérea e marítima, na representação europeia, nos domínios comercial, empresarial, turístico, ambiental, etc. São incontáveis os interesses comuns. Mesmo a afirmação da MACARONÉSIA como realidade simbólica e política transnacional, com afirmação europeia, só ocorrerá verdadeiramente quando Açores e Madeira estreitarem essas pontes. Esperemos que seja isso o que brotará dos apertos de mão que, por estes dias, trocaram Vasco Cordeiro e Miguel Albuquerque.
 

quinta-feira, 18 de janeiro de 2018

Café Royal LV

“Centrão”

A vitória de Rui Rio abre um novo ciclo no cenário político português. O ciclo do “Centrão”. Todos conhecemos o carinho que Costa e Rio nutrem um pelo outro, nem os próprios o disfarçam. Costa recebeu o novo líder do PSD com ouro, incenso e mirra. E Rio não parou de apregoar as virtudes do “centrão”. Costa e Rio, dois veneráveis decanos das lides políticas e partidárias desejam, como pão para a boca, com o beneplácito papal de Marcelo, ofertar ao país o mítico El Dorado do Bloco Central, qual fonte da eterna juventude. Mas o problema está em que a única ambição do grande “centrão”, com os seus caciquismos, estratagemas, artimanhas, conluios e essas pútridas máquinas de formatar votos e eleitores, é a sua perpetuação no poder. O esboroar da Esquerda e da Direita, a morte das ideologias, deu nisto: a única inquietação do “centrão” é a sobrevivência dos seus aparelhos, para a qual o país é apenas um instrumento e, nós todos, nada mais do que um meio para esse fim. Coincidência, ou não, a vitória de Rio deu-se no mesmo momento em que na Alemanha Merkel e Schultz apertaram a mão para um novo entendimento ao centro, mas um centro todo ele baloiçado para a Direita. Para onde balanceara o nosso “centrão” nacional?

in Açoriano Oriental

quinta-feira, 11 de janeiro de 2018

Café Royal LIV

Os Açores

Ao longo da História, as ilhas foram sempre a sua localização. “A importância internacional dos Açores foi lhe sempre atribuída […], pelo contexto da política internacional. A Horta já foi mais alemã e inglesa, e o porto de Ponta Delgada mais norteamericano do que britânico, ou francês […]; a Terceira, mais britânica e Santa Maria, mais americana, […] e até ainda há pouco tempo as Flores albergavam observadores balísticos franceses.” Explicou Medeiros Ferreira. Não compreender o valor arquipelágico das ilhas é falhar perceber os Açores. Nos últimos meses assistimos, com espanto e pavor, a uma incompreensível e inaceitável diatribe da Terceira contra São Miguel. Por causa do dossier Lajes, têm-se alimentado visões bairristas do arquipélago, sem o mais básico sentido histórico e noção do papel fundamental que cada uma destas nove ilhas, abraçadas de mar, têm para com cada uma das outras… Estar na Horta, com ou sem um copo de gin, pousar o olhar no canal e admirar a montanha que se agiganta acima do mar, desafiando o céu com a sua grandeza de vulcão é, se não toda, parte fundamental, da essência açoriana. Não saber aceitar isto é não saber nada. É não merecer ser Açores, seja no Royal, no Atanásio ou no Internacional…

in Açoriano Oriental

 

quinta-feira, 4 de janeiro de 2018

Café Royal LIII

Reinvenção
 
Foi esta a expressão escolhida por Marcelo para marcar a sua mensagem de ano novo. Reinvenção do futuro, é o que o presidente vem pedir ao país, em particular ao atual governo, ungindo-se de um caracter messiânico, qual D. Sebastião soerguendo-se das chamas de um país calcinado. Olhando 2017 há, de facto, uma sensação profundamente amarga de um país bipolar. Por um lado, um Terreiro do Paço capaz das maiores façanhas políticas e financeiras. Por outro, todo um país deserto, envelhecido e carbonizado. A invectiva a uma regeneração que vá para além da mera reconstrução contabilística ou de engenharia civil parece, sem sombra de dúvida, um imperativo nacional. Mas onde S.Exa. o Presidente da República falha é na necessária contrição pública pelo que ficou para trás e nas suas próprias responsabilidades, seja como político, seja como pitonisa televisiva. O sistema politico partidário português, saído de Abril, degenerou numa rede sub-reptícia de aproveitamentos privados, abstraindo-se, totalmente, daquilo que o país é e precisa. Talvez a maior reinvenção que seja preciso fazer hoje, em Portugal, é de políticos e de políticas, regenerando-se algo tão simples como o interesse público. Mas, para isso, não chega tirar selfies e cultivar os afectos…