As vencedoras e os vencidos
Os cenários pós-eleitorais são sempre férteis em elações, conjeturas,
explicações e narrativas. Os americanos até têm um nome próprio para os
profissionais que se dedicam a esta arte específica da comunicação política: os
chamados spin doctors. Que é como quem diz, especialistas em dar a volta
aos resultados.
Estas últimas eleições autárquicas, em particular aqui nos
Açores, foram ricas em exercícios de contorcionismo verbal, sobretudo por parte
dos líderes dos grandes partidos e, de forma bastante contundente, do candidato
do PSD à Câmara de Ponta Delgada, todos prontos a clamar para si vitórias,
mesmo que fossem vitórias de Pirro, como foi o caso.
Cada um, à sua maneira, cantou vitória, reclamando para si e
para os seus os louros de mais votos, mais mandatos, uma percentagem que sobe
aqui, uma freguesia ganha acolá. É o habitual nestas ocasiões, mas nem sempre é
o mais justo, muito menos o mais verdadeiro.
No meu entender, o facto mais relevante destas eleições é,
sem dúvida (ainda mais do que o alarme falso do CHEGA!...), a extraordinária
vitória das mulheres. Nunca os Açores tiveram tantas mulheres a liderar
autarquias, numa demonstração clara de uma evolução sísmica na política
regional. Fátima Amorim, Ana Brum, Catarina Manito, Elisabete Nóia, Catarina
Cabeceiras, Vânia Ferreira, Bárbara Chaves e Graça Melo, esta última com uma
vitória tão retumbante quanto surpreendente. E, se juntarmos a isto as prestações
inesperadas de Sónia Nicolau e de Lurdes Alfinete, uma tirando a maioria a
Pedro Nascimento Cabral na maior autarquia dos Açores, e a outra ficando a uns
escassos trezentos e poucos votos de virar a Ribeira Grande, temos uma
demonstração vibrante de que foram, sem sombra de dúvida, as mulheres as
grandes vencedoras desta noite eleitoral.
No campo dos derrotados, e ao contrário do que quiseram
fazer parecer nos seus discursos de circunstância, José Manuel Bolieiro,
Francisco César, Paulo Estêvão, José Pacheco e Pedro Nascimento Cabral saem da
noite de domingo com mais razões de preocupação do que de regozijo. Por mais
que o líder do PSD e do Governo queira cantar vitória, não consegue uma vitória
robusta que lhe dê lastro para sobreviver às tempestades que aí vêm, nomeadamente
as da SATA, da bancarrota e de um orçamento regional com mais austeridade do
que o da Troika. Paulo Estêvão sofre uma derrota envergonhante no seu pequeno
feudo particular, agravada pelas suspeitas que recaem sobre o seu candidato.
José Pacheco ficou longe do que pretendia, ou sequer do que se esperava e,
apesar de garantir a eleição para vereador em Ponta Delgada, não consegue, nem
nas freguesias, as vitórias que lhe vaticinavam os observadores.
Por último, Francisco César vê o partido resvalar ainda mais
no seu processo descendente que, apesar de ter mais votos do que o PSD, se
traduziu na perda de câmaras, freguesias e mandatos, com a vergonha maior de
ficar em terceiro lugar, atrás de Sónia Nicolau, em Ponta Delgada. Onde, aliás,
seria importante que os dirigentes da secção concelhia do partido tirassem as
devidas ilações da péssima condução de todo este processo.
Em Ponta Delgada, Pedro Nascimento Cabral perde dois
vereadores, fica empatado com Sónia Nicolau e sofre uma queda impressionante de
quase quatro mil votos. Fica agora dependente de difíceis negociações para
conseguir aprovar o seu programa, tarefa árdua para alguém que já demonstrou
não ter feitio para grandes diálogos.
Espero sinceramente que, neste cenário difícil que se
avizinha, tanto na Câmara de Ponta Delgada como na Região, não venha a ser o PS
de Francisco César a dar a mão aos desmandos de um PSD que, em conjunto, pode
reivindicar os dúbios títulos de pior presidente de câmara e pior governo
regional de sempre. Nem mesmo com a desculpa esfarrapada da “estabilidade”, porque
a estabilidade é o refúgio dos fracos, e os Açores pedem lideranças fortes para
navegar tempos de tempestades…
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