Começou, primeiro, como um boato. Meia dúzia de linhas, atiradas ao turbilhão do Facebook, faziam constar a possibilidade do PSD-Açores não apresentar lista de candidatos a deputados no círculo eleitoral do Corvo. O facto era de tal modo inusitado que parecia uma brincadeira, mas esta semana a brincadeira tornou-se realidade e foi a própria líder do PSD quem o confirmou.
Em declarações aos órgãos de comunicação social, depois de uma reunião, que imagino tensa, da comissão política do partido, Berta Cabral, diz mais ou menos isto: para evitar a dispersão de votos e para impedir que o PS elegesse dois deputados na ilha do Corvo o PSD acha que a melhor estratégia é apoiar o candidato do PPM! Esta manobra, para não lhe chamar outra coisa, é extraordinária a vários níveis, mas interessa-me destacar dois ou três aspetos. Em primeiro lugar, a assunção clara por parte da líder do PSD de que não têm hipótese de ganhar no Corvo. Perante este facto, aposta na subjugação do seu partido à efígie de um popular aventureiro que, nos últimos meses, tem andado, qual caixeiro-viajante, a negociar coligações com tudo o que vagamente tenha estatuto de partido no tribunal constitucional. Nem quero imaginar o que pensarão os verdadeiros sociais-democratas destas novas amizades da Dra. Berta Cabral, nem tão pouco do triste espetáculo de verem o PSD-Açores descer ao nível de um pequeno partido a choramingar coligações com tudo o que mexa. Depois, um aspeto que me parece bastante mais grave. Na curta historia da pequena democracia açoriana, sociais-democratas e socialistas, umas vezes mais uns do que outros, mas sempre ambos com o mesmo afinco e honra, se apresentaram aos eleitores açorianos como os verdadeiros partidos da autonomia a da autêntica afirmação de uns Açores unos e como projeto viável de governação e de futuro. Dessa estratégia sempre fez parte, não só por razões eleitoralistas, mas acima de tudo por razões de afirmação de um ideário autonómico pleno, a apresentação de listas de candidatos a deputados em todos os círculos eleitorais, quanto mais não seja porque só um partido que emane dessa plena legitimidade parlamentar é que se pode afirmar como o partido que governa todos os açorianos. Por último, e talvez mais importante, a questão formal do maquiavelismo fácil dos fins justificarem os meios. Pressupor que para chegar ao poder é melhor para o PSD apoiar um candidato do PPM do que ir a votos por si só é uma declaração clara da incapacidade do partido em ganhar eleições, se nas últimas eleições autárquicas já tínhamos assistido ao triste espetáculo da líder do PSD abandonar o seu partido à desgraça dos resultados, acantonando-se no seu concelho, assistimos agora, mais uma vez, à forma vil de fazer política da Dra. Berta Cabral, que é capaz de sacrificar o partido para não se sacrificar a si. Talvez seja mesmo necessário ao PSD Açores passar por este calvário por onde a presente direção do partido o encaminha, para que após a derrota nas próximas eleições, uma nova direção, possa restaurar um pouco de dignidade àquele que, em tempos, já foi um grande partido da autonomia, para que, quem sabe daqui a doze anos, o PSD Açores possa apresentar-se aos açorianos como um partido, se não ganhador, pelo menos credível, algo que neste momento, claramente, não é.