A Pedra Filosofal
O passado fim-de-semana foi pródigo em fenómenos partidários
na região. Em Ponta Delgada, os sociais-democratas reuniram-se em congresso. Uma
concentração pujante, impregnada pelo odor inebriante do poder, que teve
inclusive direito a destacados convidados de honra. Luís Montenegro, Miguel
Albuquerque e, a coqueluche juvenil da social-democracia lusa, o Tom Riddle do centro-direita,
o delfim Sebastião Bugalho. Ex enfant terrible do comentário político e
hoje bem-instalado deputado europeu. Por seu turno, o Partido Socialista, reuniu
timidamente a sua comissão regional, num pequeno auditório na singela e pitoresca
Vila Franca do Campo. Nestes dois encontros, uma nota comum perpassa um pouco
pelo tom dos discursos e da coreografia política: a obsessão com o “novo”. De um
lado e do outro, este parece ser o foco principal de toda a acção político-partidária,
o culto e a fixação na renovação e na juventude. O PS-Açores, até, adotou como
slogan “um novo futuro” e fez anunciar que tinha renovado em mais de 81%
o seu secretariado regional.
Na velha ciência alquímica, uma das mais ambicionadas quimeras
era a descoberta da “pedra filosofal”, uma substância mágica capaz de transformar
outros metais em ouro e que era tida, também, como o elixir da eterna juventude,
capaz de dar ao seu detentor a imortalidade. Atualmente, a vida política contemporânea
parece estar tomada dessa febre, dessa embriagante pulsão pela longevidade e a
eterna juventude, expressa na permanente procura de mudança e, paradoxalmente,
de perpetuação no poder. Mesmo os partidos ditos mais conservadores parecem acometidos
dessa ânsia marxista dos “amanhãs que cantam” e das jovens promessas. Como se o
passado fosse um incandescente inferno de calamidades do qual precisam, a todo
o custo, de se distanciar.
Não me interpretem mal. Eu sou progressista e acredito no
valor da mudança. O triste não é mudar de ideias; triste é não ter ideias para
mudar, como dizia o Barão de Itáraré. Mas, é precisamente aqui, no campo das
ideias, que este culto partidário da renovação permanente me inquieta. Exatamente
porque não são as ideias que eles querem mudar, nem os métodos, nem mesmo
alguns cancros metastisados que pululam pelos vasos sanguíneos partidários como
cadáveres ambulantes, na forma de longas e inexpugnáveis carreiras políticas. O
foco único da mudança autofágica dos partidos são os nomes, as caras e, aqui e
ali, um ou outro currículo útil. O foco
da atividade partidária não está nas políticas e nas soluções e na reconquista
da confiança política dos cidadãos, mas na saltitante e permanente dança de
cadeiras dos seus protagonistas, sejam eles novos-velhos ou falsos novos.
O que a política partidária, elemento fundamental da
democracia, precisa urgentemente não é de caras novas, mas de novas soluções e outras
e melhores formas de exercer a própria política. Novos métodos e novas estratégias
para, dito de uma forma muito simples, resolver os problemas dos cidadãos. De que
é que serve renovar em 80% um órgão dirigente se os discursos, as práticas e as
ideias são as mesmas de sempre? Se as palavras são as de antigamente, se até o
tom e a forma é o mesmo que o antepassado, mimeticamente estudado ao espelho do
quarto de banho de hotel, para que servem essas fictícias renovação e juventude?
Destruíram o SNS. A escola pública está
um caos. As finanças regionais no precipício de uma bancarrota. Mas são jovens e
são novos. O que se percebe deste excitado agitar de rostos e de falsa juventude,
ou mesmo desse renovar de listas inteiras de nomes de dirigentes, é que o que estes
partidos verdadeiramente procuram é essa mítica “pedra filosofal” que lhes conceda
não a mocidade mas a eternidade no poder. Como tristes e cansados Nicolas
Flamel, descendentes de uma prática política velha e gasta que, afinal, já
pouco ou nada tem para nos oferecer.