quinta-feira, 31 de outubro de 2019

Café Royal CXLVIII


Protestos

Nos últimos tempos, um pouco por todo o mundo, os cidadãos, ou, como se diz em ciência política, o Povo, saíram à rua: os independentistas na Catalunha, os “coletes amarelos” em França, os democratas em Hong Kong, os reformistas no Chile, os confundidos, de um lado e do outro, do Brexit, e os órfãos das alterações climáticas à escala global. Numa Era de indignações digitais, de petições à lá minute, de revoltas de Twitter, perceber que as sociedades, as comunidades, ainda são capazes de se organizar e dar a cara em protestos públicos vivos e corajosos é um motivo de satisfação para qualquer democrata. O protesto e a sua manifestação pública são uma forma de expressão da vontade popular e, não é preciso saber de filosofia, para compreender que a vontade popular é a raiz fundamental de toda e qualquer Democracia. Num mundo com cada vez mais desigualdades, entre ricos e pobres, entre geografias e continentes, entre eleitos e eleitores, até mesmo entre gerações, a Voz do Povo, esteja ela em ruído na rua ou no falso silêncio da abstenção, assume cada vez maior importância e não vale a pena fazer de conta que não se está a ouvir ou, pior, reagir com despeito e arrogância àquilo que não se gosta de ouvir…


quinta-feira, 24 de outubro de 2019

Café Royal CXLVII


Cataclismo

O crescimento recente do Turismo deveu-se, em larga medida, a dois factores fundamentais: marketing e aviões. Ryanair, Easyjet e Delta permitiram um incremento crucial nas acessibilidades que, em Turismo, como sabemos, para um destino arquipelágico como o nosso, é tão vital como o oxigénio é para os pulmões. Em paralelo, a promoção nos mercados e o aumento da notoriedade tornou os Açores atractivos para os potenciais turistas. Porém, nos últimos anos, o Governo e a Secretaria do Ambiente, Energia e Turismo (só a hierarquia do nome diz tudo…), entretidos a brincar à sustentabilidadesinha, conseguiram, não só destruir por completo a promoção turística do destino, entregando esse dossier decisivo na mão de meia dúzia de empresários como, também, deixar que a Delta abandonasse o destino, tornando-nos reféns da Ryanair, da TAP e da moribunda da SATA. Não havendo uma explicação, ou responsabilização ou, até, uma alternativa para este autêntico cataclismo não resta, lamento, outra saída à Sra. Secretária, e à direcção da ATA, já agora, que não seja a demissão.


quinta-feira, 17 de outubro de 2019

Café Royal CXLVI


Harold Bloom

Faleceu, esta semana, aos 89 anos, o mais importante crítico literário da contemporaneidade. Harold Bloom foi o inventor do chamado “Cânone Ocidental” – um corpo literário autónomo e robusto que, desde a antiguidade clássica aos nossos dias, com Shakespeare como vértice, representa o legado cultural da nossa civilização. Esta teoria, muitas vezes mal interpretada, levou a que fosse atacado pelos membros daquilo a que Bloom classificou como as “escolas do ressentimento”. Muitos dos que o atacaram, com base em revisionismos ideológicos e identitários, esqueciam a importância dos seus muitos contributos para a cultura, nomeadamente a tese, apresentada em “The Book of J”, de que os primeiros escritos hebraicos, que compõem o Antigo Testamento, teriam sido escritos por uma mulher. Ou, a sua teoria da “Angústia da Influência”. Numa época em que com 280 caracteres se consegue governar o mundo, Bloom merece, mais do que nunca, ser lembrado, pela sua defesa intransigente do prazer da leitura, e da importância maior que a literatura tem na expressão da condição humana ou, como o próprio referiu com relação a Shakespeare, a “invenção do humano”.


quinta-feira, 10 de outubro de 2019

Café Royal CXLV


Do alheamento

Uma semana depois da passagem implacável do furacão Lorenzo pelos Açores, o Porto das Lajes, que foi arrasado pela força bruta do mar, deverá em breve retomar, parcialmente, a sua operação. Este facto deve-se à resiliência da população das Flores e, ao esforço conjunto das autoridades regionais, da Portos dos Açores e, principalmente, da Marinha Portuguesa. Não fosse a imediata prontidão, a capacidade técnica, logística e humana da Marinha e a Autonomia, per si, não teria a capacidade de tão rapidamente minimizar os danos causados pela tempestade. Este é um exemplo básico de “solidariedade nacional” e daquilo que o Estado faz pela população. No entanto, no passado Domingo, os Açorianos, pareceram alhear-se deste facto e brindaram o País com a maior taxa de abstenção de sempre. O Presidente do PS fez questão de dizer, na noite das eleições, que a abstenção, hoje, nos Açores, é inaceitável. Mas, quando a população parece desrespeitar por completo aquilo que o País faz por si e culpa os políticos por esse alheamento, como explicou um estudo que foi engavetado no parlamento regional, e os próprios políticos estão narcisicamente enleados nas suas fotos no Facebook, a esperança de que se possa mudar esta realidade é quase nula…


quinta-feira, 3 de outubro de 2019

Café Royal CXLIV


Votar

Ao contrário do que seria de esperar, a campanha eleitoral, afinal, foi tudo menos sensaborona. Tivemos um António Costa titubeante entre a ganância da maioria absoluta e as sonsices habituais de quem lhe dói as costas. Um Rui Rio sempre a crescer e uma Assunção a perder a crista. Depois, tivemos essa novela pifara de Tancos: umas forças armadas relapsas, ladrões de pacotilha que se lixam por 34 mil euros, polícias e magistraturas em guerrinhas de manjerona, ministros idiotas que trocam sms inenarráveis com políticos jovens, mas que tresandam a velhas formas de fazer política. Enfim, um retrato exacto do Portugal de hoje. E, não esquecer, a melhor alcunha desde o famigerado “Cherne”, o “papagaio-mor do reino”. Não se pode dizer que não foi divertida, infelizmente é rir para não chorar. A acreditar nas últimas sondagens, Domingo, os portugueses vão indicar a António Costa uma Geringonça 2.0. Até os eleitores do PS não querem uma maioria absoluta e isso devia servir de lição para a direcção do partido. As incógnitas são os novos partidos e o peso do PC. Quanto à direita, mesmo que Rio se aguente, os próximos 4 anos serão de total e completa refundação. Mas, para já, é preciso votar.