quinta-feira, 28 de maio de 2020

Café Royal CLXXVI


O novo mesmo

Debelada a febre sanitária, a política começa a acordar para a gangrena económica. Por todo o lado, o que se vê e ouve é: recessão, depressão e crise. Acossados pelo troar dos cascos dos novos cavaleiros do Apocalipse – falências, desemprego, pobreza e fome – os políticos apressam-se, em afã mediático, a fazer passar a ideia de que estão empenhadíssimos na construção do “novo normal”. Vemo-los em reuniões e visitas e escutamos-lhes as declarações pesadas. Contudo, chegados cerca dos microfones, vemo-los a tirar as máscaras cirúrgicas, mas não deixam cair as outras, as máscaras do cinismo e da hipocrisia. Por detrás da falsa inquietação, continua o mesmo “business as usual”, os mesmos compadrios, os mesmos jogos de bastidores, os mesmos Novos Bancos, o mesmo e escabroso calculismo eleitoral que leva um Primeiro-ministro socialista a apoiar o mais demagógico e reaccionário Presidente da República da nossa democracia ou, o próprio Carlos Cesar a insultar publicamente Ana Gomes, uma das mais integras e competentes figuras do partido e candidata natural do PS às presidenciais. As nossas vidas mudaram, mas as deles continuam na mesma, preocupados apenas com ganhar eleições.


quinta-feira, 21 de maio de 2020

Café Royal CLXXV


O Isolamento

Não! A insularidade não é uma vantagem. Nem o total isolamento dos Açores é possível quando a região até cebolas importa. É arrogância pensar-se que, mais tarde ou mais cedo, o vírus não conseguiria um portador para o desembarcar nas ilhas. Um marinheiro, um piloto, um médico especialista, um pelotão do exército ou, quem sabe, se ele por cá já não andava, contagiando assintomaticamente, trazido pelos representantes da Marca Açores que se exibiram em Lisboa em Fevereiro. Ou, pelos abonados funcionários que foram comprar prendas à Primark em Dezembro? Também, não serão as citações de Ciprião de Figueiredo ou as bandeiras da autonomia que vão inventar uma vacina, nem a Federação Agrícola vai produzir Hidroxicloroquina, ou outro fármaco qualquer que mate o bicho. A soberba de imaginar uma região asséptica e impenetrável aos ares do mundo é absurdo, desastroso e um retrocesso gigante para a Região. Cada uma das nove ilhas é Açores, os Açores são Portugal que é uma das 27 partes de uma Europa que será fundamental para sairmos desta crise, a maior das nossas vidas, e da qual ninguém sairá sozinho. O isolamento, seja ele constitucional ou não, só nos trará morte.


quinta-feira, 14 de maio de 2020

Café Royal CLXXIV


Levantemo-nos!

Não existe um ‘nós’ e os ‘outros’, só existe o ‘nós’. A Solidariedade é, e tem de ser, indivisível.” A frase é de Olof Palme e vale a pena lembrá-la quando é o Socialismo que é vítima da peste. Se aos cientistas não se lhes exigia sensatez, aos políticos era imperativo, ético e moral, que contrariassem todo o tipo de autoritarismo na resposta ao vírus. O isolamento, de um indivíduo, ou de uma região, é a antítese do Socialismo, que é solidário e Internacional por natureza. Nos Açores, desde a laranja, ao boom do Turismo, o progresso económico e social aconteceu sempre nos momentos de maior abertura. É especialmente triste ver agora o PS-A a defender o fecho de aeroportos e quarentenas segregacionista, rejeitando a memória de todos os que, durante os governos do PPD, lutaram por abrir os Açores ao Mundo. Fosse na economia, com o Turismo, fosse na cultura, com a crítica à censura do genérico de uma simples telenovela. O “orgulhosamente sós” e a ausência de verdadeiras políticas sociais são uma dupla condenação à morte, pior do que o próprio vírus. Proudhon, um dos pais intelectuais de Antero, escreveu: “Os grandes só são grandes porque nós estamos de joelhos. Levantemo-nos. 


quinta-feira, 7 de maio de 2020

Café Royal CLXXIII

Os Vírus

Nesta pandemia surgiram vários vírus, alguns deles mais perigosos que o Covid-19. Primeiro, e o mais grave, o da desumanização. Vivemos subjugados por números, gráficos, dados e o nosso cotidiano passou a estar suspenso pelo R0 (alguém sabe o dos Açores?). Deixámos de ser pessoas, com vidas e sentimentos, reduziram-nos a meras estatísticas e a circunstâncias epidemiológicas. Cada ser humano não é mais do que um Uber da contaminação. Depois a transparência, que os Governos tanto reclamam. Mas, informação fundamental, tanto sobre a doença como sobre a calamidade social e económica, é ocultada, manipulada e, por vezes, até abertamente equivoca. Por fim, o unanimismo. Impelem-nos, à força e sem contraditório, para uma espécie de conformidade amordaçada onde imperam incontestáveis os valores da saúde pública. Como se o único conhecimento válido fosse o das ciências da vida. Obrigam-nos a descartar todo o tipo de outros saberes – filósofos, historiadores, geógrafos, economistas, sociólogos, psicólogos, até politólogos – e as nossas vidas são entregues, atropelando a Constituição e o mais básico bom-senso, à ditadura aleatória da Autoridade de Saúde.