A letra da lei
No último mês de Julho veio a público o rocambolesco episódio
das golas antifumo. O que estava em causa, entre outras coisas, era o
envolvimento de um Secretário de Estado na contratação de uma empresa detida
por familiares de um adjunto. Ao melhor jeito da saloiice nacional, o PS e o
Governo ensaiaram uma fuga para a frente, reclamando que “seria um absurdo a
interpretação literal” de uma lei de 1993, que até hoje nunca fora contestada
por nenhum governo ou partido. Vai dai, é pedido um parecer, pelo Primeiro-ministro,
ao Conselho Consultivo da Procuradoria Geral da República, para o “completo
esclarecimento”, sobre a letra da lei, da já famosa Lei das Incompatibilidades
dos Titulares de Cargos Públicos. Ora, o que torna tudo isto ridículo não é as
golas pegarem fogo, ou a tentativa de interpretação a gosto das leis, nem
sequer a ostensiva e inescrupulosa falta de ética dos nossos governantes, o que
torna tudo isto verdadeiramente absurdo é o esquizofrénico facto de, na mesma
semana, o mesmo Ministério Publico, constituir como arguido o Secretario de Estado,
enquanto o seu Conselho Consultivo acha que a lei não pode, afinal, ser lida literalmente.