quinta-feira, 27 de setembro de 2018

Café Royal XCI

Honrar Antero

A “Questão Coimbrã” foi uma das mais célebres polémicas da história nacional. Choque intelectual entre duas gerações, opôs o jovem Antero de Quental e o velho António Feliciano de Castilho. No cerne da disputa estavam duas concepções distintas do papel da literatura na sociedade. Para Antero e a sua “Geração de 70”, a literatura deveria ser o motor da revolução social, por oposição à visão imobilista e ultrarromântica daquilo a que Antero chamou a “Escola do Elogio Mútuo” e cujo centro era Feliciano de Castilho. Mas, mais do que uma disputa literária, esta foi uma discussão política, marcada pela visão positivista ou, mais ainda, socialista de Antero. Sabendo isto, é com enorme estupefação que vimos um excerto da carta “Bom Senso e Bom Gosto”, de Antero, a epigrafar a Moção de Estratégia de Alexandre Gaudêncio ao Congresso do PSD/Açores. Escolher Antero como figura tutelar só pode significar duas coisas: ou Gaudêncio não sabe quem foi Antero, o que é grave, ou pretende um PSD/A socialista e revolucionário, o que seria surpreendente. Porém, o que as duas mostram é uma enorme e confrangedora falta de cultura política e literária.
 

quinta-feira, 20 de setembro de 2018

Café Royal XC

Os Areais

Naquele tempo, íamos surfar, às escondidas, para o Monte Verde. A primeira vez que fomos aos Areais foi com o Armindo e o Marco Sousa. Entrando pelo lado onde hoje é o Tuká Tulá, não havia praia. Era um imenso calhau, espécie de despojos da rapina dos apanhadores ilegais de areia. Do outro lado, junto ao morro de Santana, a entrada era feita pela estrada. Seguíamos por um caminho de terra e descíamos o pequeno carreiro na falésia até à praia, ao encontro daquele lugar paradisíaco e incólume, apenas nós e algumas das mais fantásticas ondas da ilha. Hoje, a praia dos Areais de Sta. Barbara é uma das melhores e mais utilizadas zonas balneares da ilha e é, também, um importante cartaz turístico, fruto da projecção global dos campeonatos de Surf. E é com um enorme orgulho que sei que o aproveitamento e qualificação de um valioso pedaço desta ilha se ficou a dever, também, ao empenho e vontade de um pequeno grupo de surfistas. Os Areais são um feliz exemplo de como as boas vontades, se bem orientadas, podem trazer benefícios para todos. Quão bom seria se esse exemplo fosse seguido, por outras pessoas, noutros lugares destas ilhas…

in Açoriano Oriental

quinta-feira, 13 de setembro de 2018

Café Royal LXXXIX

A Escola

Vão recomeçar as aulas. Como se o fim do Verão e as agruras típicas do regresso ao trabalho não fossem, já de si, angustiantes o suficiente, eis que, de supetão, cai sobre pais e filhos, professores e alunos, o tormentoso turbilhão do regresso à escola. Os horários, as actividades extracurriculares, os manuais, os materiais, as mochilas, as roupas, todo um infindável rol de pequenos/grandes problemas que, por estes dias, consomem quase por completo uma grossa fatia da sociedade. Até aos avós hão de chegar as ondas de choque do ano lectivo. As nossas sociedades transformaram a Escola num espaço de contenção das crianças e, até, em certo sentido, dos pais. A padronização e sistematização dos processos e das regras do sistema educativo criaram um ambiente quase que opressor para todos os que, de uma forma ou de outra, lidam com a Escola. Horários rígidos e excessivamente longos. Currículos padronizados, avaliações quantitativas. (Já para não falar nessa instituição arcaica chamada “trabalhos de casa”, que transporta a escola para dentro da vida familiar, desesperando as crianças e infernizando os pais). Valerá a pena perpetuar este sistema?
 

quinta-feira, 6 de setembro de 2018

Café Royal LXXXVIII

Vontade

Depois de uma apresentação mediática, foi ontem tornada pública a Moção de Vasco Cordeiro ao próximo Congresso do PS Açores. O documento aponta 3 grandes áreas de actuação: Afirmação dos Açores no contexto nacional e internacional; Coesão entre as ilhas; Qualificação da Democracia. Dos 3, há um que merece destaque – “Reforçar a Coesão Partindo da Diferença”. Aí é expressa a intenção de olhar para o desenvolvimento económico e social das ilhas, partindo da identificação e valorização das diferenças entre elas e já não da tentativa de as tornar iguais, algo que culminou na efervescência bairrista que os Açores vivem hoje. O que fica por saber é se esta ambição de Vasco Cordeiro, em si válida e extremamente necessária, se resumirá apenas a um mero texto de uso político. Ou, pelo contrário, mais do que uma mera ambição, a sua vontade é levar realmente a cabo, ilha a ilha, este novo paradigma de governação. Se for assim, esse será o seu maior legado à Região e um cortar, definitivo, com as políticas, e os políticos, do passado. Esperemos que sim…