É, talvez, a mais antiga verdade da natureza – a luta entre
os fortes e os fracos. Quem tem força tem poder e pode, a qualquer momento, exercê-lo
sobre quem não o tem. Houve quem lhe chamasse “a lei da selva”. Mas as
comunidades humanas tentaram, ao longo da História, umas vezes melhor outras
pior, contrariar este paradigma. Usando o pensamento o homem tentou organizar a
sua existência em torno de princípios tão estranhos como liberdade, fraternidade
e igualdade. Houve quem dissesse que era isso que nos separava dos animais. No plano
da organização política muitas foram as tentativas, os falhanços e os sucessos.
Ao longo da História pensou-se que a melhor forma de organização seria aquela
que desse voz aos povos e que estes elegessem os seus melhores para, com
respeito pelas minorias, organizar a comunidade tendo em vista o bem comum. Pensou-se
até que seria possível uma organização transnacional de comunidades que, baseadas
nos mesmos valores de respeito pela dignidade humana, pudessem,
democraticamente, decidir pela forma mais benigna de, dando prosperidade às
populações, salvar o planeta. Grandes estadistas afirmaram mesmo que embora
fosse péssimo, esse sistema, era o melhor de todos os maus sistemas de governo.
Chegamos então ao nosso tempo, em que, mergulhados numa profundíssima crise, o
primado essencial da política deixou de ser o ser humano, o bem-estar da
comunidade, mas a “confiança dos agentes económicos e dos mercados”. Mais importante
para um decisor político do que a confiança das populações é a prosperidade dos
mercados. Governar não em função da prosperidade das populações, mas com vista
a que os mercados não vejam os seus negócios dificultados. Chegamos à Dividocracia.
Habituem-se, que ela vai ficar por ai durante muito tempo.
Tenho muito pouco, nada, de católico. Tenho apenas o pouco
de cultura que o acaso de ter nascido nela pode dar. Mas não pratico, nem
creio. A minha fé é outra. Porém, acredito e conheço o suficiente de História
para não deixar passar em claro a importância, a influência, que a Igreja e o
seu Papa têm na vida mortal. Não deixa de ser extraordinário que, num momento
em que o mundo, e em particular o mundo contemporâneo, ocidental,
judaico-cristão, passa por uma das suas mais graves crises de identidade, seja
da Igreja Católica e deste seu novo Papa que surja um sinal no sentido certo.
No meio de toda a imoralidade, da selvática guerra financeira e do desinteresse
global, Francisco, em Lampedusa, indica o caminho. Não é preciso ser católico
para entender a verdade do gesto que nos diz que ao nosso lado há sempre alguém
que sofre, que perdeu tudo, ao ponto de arriscar a vida por uma hipótese de
futuro. E o desespero já não está só em Africa, está aqui, ao lado de cada um de
nós. “Tende a coragem de acolher aqueles que procuram uma vida melhor”…