Batendo aos portões de Santana
Ponta Delgada, que foge ao PS desde 1989, tem sido uma pedra
no sapato político das sucessivas direções socialistas. Por um lado, é alvo apetecido,
a principal autarquia do arquipélago e feudo social-democrata de longa data,
por outro representa uma ameaça tácita ao status quo diretivo do
partido. Ser presidente da câmara de Ponta Delgada representa uma espécie de pole
position para a conquista do Palácio de Santana, como se os portões de
Santana se abrissem ali junto às Portas da Cidade, pela importância e
visibilidade que o cargo confere. Por isso, as direções do PS sempre olharam
com desconfiança para essa disputa eleitoral. Não podem deixar de concorrer, apresentando
candidatos suficientemente relevantes para não serem acusados de falta de comparência,
mas sempre secretamente conspiraram para que o partido não saísse vencedor
dessa particular eleição. Nos últimos anos, os líderes do PS optaram sempre por
não se empenhar totalmente nessa corrida, percebendo que qualquer presidente da
câmara de Ponta Delgada se tornaria instantaneamente na segunda figura do
partido e opositor interno inevitável. Na lógica do controlo do poder convêm
que as sucessões, ou as putativas ameaças à liderança, sejam geridas pelos próprios
e sem radicais livres a correr por fora nas suas próprias pistas.
Este ano, a corrida a Ponta Delgada reveste-se de um
interessante conjunto de pormenores aliciantes. Desde logo, são as primeiras eleições
autárquicas desta direção do PS, e com a condicionante de este estar na oposição
a nível regional, o que torna o resultado conjunto destas eleições autárquicas determinante
para o seu futuro político. Por outro lado, há um notório e palpável desgaste do
atual executivo camarário, corporizado na altivez e autoritarismo do seu
presidente, que criaram enormes anticorpos junto de diversos sectores da
sociedade civil, das empresas e do eleitorado em geral. Já para não falar no surgimento
de uma candidatura independente, saída precisamente das fileiras do PS e
largamente criada pela inabilidade das direções do partido, concelhia e
regional, em dialogar com os seus críticos e gerar consensos dentro do próprio partido.
No passado fim-de-semana os órgãos dirigentes do PS
aprovaram, finalmente, os seus cabeças de lista às próximas eleições autárquicas.
De entre uma mais ou menos anódina e pouco surpreendente lista de nomes o destaque
maior recaiu, obviamente, sobre o nome anunciado à câmara de Ponta Delgada que,
ao fim de um longo e conturbado processo, que ao que consta até sondagens envolveu,
naquilo que o líder do partido classificou, eufemisticamente, de “rapidez
possível”, calhou a Isabel Almeida Rodrigues, alguém com um inegável currículo
político e capacidades, mas que se encontra ausente da política local há vários
anos. Na atual conjuntura, as primeiras ações da candidata agora anunciada
serão determinantes para se perceber se esta é uma candidatura ganhadora ou se,
mais uma vez, o PS apenas pretende não perder por muitos, iniciando desde já o spin
dos resultados para as análises de contexto e outras desculpabilizações.
Caberia objetivamente ao PS afirmar-se como líder de uma
grande coligação de oposição ao trabalho do atual executivo camarário, chamando
a si, não só os dissidentes, começando pela própria candidata independente, figuras
da sociedade civil e até outros partidos para, tal como em 1989, consubstanciar
uma candidatura que fosse agregadora, abrangente e plural, concretizando-se em propostas
concretas e inovadoras aos problemas que o concelho, nas suas múltiplas assimetrias,
enfrenta e merece ver solucionados. Caberá à candidata do PS dizer ao que vem, embora
sabendo que já vem tarde. Quanto ao resto, o resultado dirá se os dirigentes do
PS queriam de facto ganhar Ponta Delgada ou se, afinal, e como tem sido habitual,
esta foi apenas e só uma candidatura para cumprir calendário.
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