quinta-feira, 25 de fevereiro de 2021

Café Royal CCXV

Bulldozeriando

O Ocidente sempre lutou pelos valores fundacionais do Humanismo. Aquilo a que Karl Popper chamou “Sociedade Aberta” – Liberdade, Igualdade e Solidariedade. Porém, o atual nevoeiro pandémico veio adensar o manto de arbitrariedade e autoritarismo das forças do Império da Intolerância. Por toda a Europa, governos acossados por um absurdo maniqueísmo moral, refugiaram-se cegamente nas masmorras soturnas e insalubres do fascismo sanitário, transportando-nos a todos, novamente, como condenados nos tétricos vagões de Birkenau, rumo a um extermínio civilizacional que julgávamos permanentemente ultrapassado. A mais recente insanidade covídica é a peregrina ideia de um “passaporte viral”, espécie de medieval salvo-conduto, que permite aos mais abastados e vacinados cruzar fronteiras entre países. O mais chocante nesta proposta abstrusa é perceber como os governos procuram corrigir as arrasadoras consequências de encarceramentos ilógicos e discriminatórios à custa de investidas de bulldozer sobre a equidade, as liberdades individuais e os valores essenciais do mais básico humanismo.  

in Açoriano Oriental

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2021

Café Royal CCXIV

A vitamina

Nos últimos tempos, António Costa tem-se referido ao Plano de Recuperação e Resiliência e aos fantásticos euros que supostamente por aí veem, já não como a “bazuca”, mas como a “vitamina”. Este súbito câmbio de expressão metafórica, embora menos bélico, é, infelizmente, muito mais sinistro. O que esta imagem medicinal revela é simplesmente o quão alienado, ou néscio, anda o nosso Primeiro-ministro, ao ponto de julgar que se pode ressuscitar um morto com pastilhas de Cecrisina. Por culpa do seu desgoverno da pandemia, a economia está moribunda. E, em alguns sectores, como é o caso das indústrias criativas ou da hospitalidade, por exemplo, empresas há que já foram liminarmente eutanasiadas por decreto do governo, sem que qualquer panaceia as possa, milagrosamente, reviver. Mas, esta ideia de que se pode curar um morto com uma colher de vitamina, é o mesmo tipo de pensamento mágico que lhe faz acreditar que é a vacina que nos vai salvar do mafarrico viral. O que Costa nunca percebeu é que o problema não era o vírus, nem a cura, mas a absoluta ausência de saúde que já antes nos acometia. De tanto querer curar a doença esqueceu-se que o mais importante é haver saúde.

in Açoriano Oriental

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2021

Café Royal CCXIII

Ode à inépcia

Bolieiro é um “gajo porreiro”. Ar bonacheirão e agradável bonomia, é difícil não se simpatizar com a figura. Mesmo a sua exagerada propensão para o rococó discursivo, passa mais por anedótica do que antipática. Acresce, a sua notória “estrelinha” política, que fez com que os cargos lhe caíssem no colo, sem que para isso tivesse de se esforçar ou, se quer, mostrar qualquer tipo de particular competência. Foi assim em Ponta Delgada, é assim no Palácio de Santana. Na Câmara, desde os terrenos da Calheta, ao rocambolesco “Azores Parque”, (vendido por 500, vai ser em parte recomprado por 5 milhões, porque alguém, por tolo ou dolo, se esqueceu que lá metido estava o imprescindível Parque de Máquinas) o que fica do mandato de Bolieiro é uma infinita incompetência. Já no Governo, o que rapidamente se percebe é que quem realmente manda não é o mesmo que sorridentemente nos prometeu um governo “transformista”, nem nada do que foi prometido é para ser cumprido. Das passagens a 60€, às tristes e embaraçosas nomeações, passando pela surrealista transmutação do Fundo Regional de Coesão em Direção Regional dos Assuntos Corvinos, a presidência de Bolieiro é uma Ode à Inépcia.

in Açoriano Oriental

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2021

Café Royal CCXII

O Atoleiro

Hergé, pai de Tintin, embora controverso, foi um extraordinário criador. Autor de inúmeros álbuns de banda-desenhada, inventou várias personagens memoráveis. Oliveira da Figueira, vendedor ambulante lisboeta, foi uma delas. Protótipo do português manhoso, vendendo traquitanas no deserto, é o paradigma da chico-espertice nacional. Aquilo a que vamos assistindo, sem surpresa, em torno da vacinação, é mais uma demonstração dessa tendência portuguesíssima para a batotice. O desenrascanço, usado para resolver problemas, é uma virtude e deve ser cultivado. Mas, a aldrabice, prejudicando o próximo, é um gesto obsceno e condenável. Por cá, no Atoleiro do Bolieiro, vamos assistindo, com acentuado pavor, à virulenta purga que a geringonça da direita insular vai cinicamente fazendo em tudo o que é administração pública. Depois das infindáveis juras de respeito pelas pessoas. E, as promessas de ser diferente do que lá estava antes. Com a aparente passividade cúmplice do seu respaldo parlamentar, vão desfazendo tudo quanto é cargo, num afã digno de uma trituradora. Do administrador ao inspetor, até, qualquer dia, o chapéu largo da “confiança política” servir, também, no contino, no motorista e na funcionária da limpeza, encarregue de vazar o lixo…

in Açoriano Oriental