quinta-feira, 2 de janeiro de 2020

Inquérito DA 01.01.2020


> 1 - Do que vivemos em 2019, sente que 2020 vai ser muito diferente nos Açores, no plano geral, em termos económicos e políticos?

Certamente que sim. Desde logo, e começando pela parte política, porque 2020 será um ano de eleições regionais, ao que acresce o facto de o PSD-Açores arrancar o ano com uma nova liderança e um congresso regional. Estes dois factores farão com que o ano político seja marcado, essencialmente, pelo esforço do PS-Açores em manter a sua maioria absoluta no parlamento e pela tentativa, por seu lado, do PSD-A de roubar essa maioria. Este confronto vai, certamente, mudar o cenário de quase estagnação a que assistimos, não só em 2019, mas nesta última legislatura. 
Quanto ao resto, sinceramente, não me parece que possam surgir grandes mudanças ou surpresas, tirando os casos em investigação judicial, mas já lá vamos. As grandes questões políticas, económicas e sociais dos Açores são crónicas e não creio que no quadro do actual modelo político da autonomia regional se consigam resolver: a ausência de um modelo de desenvolvimento económico sustentável, essa palavra tão na moda, mas tão vilipendiada pelos próprios políticos; as profundas desigualdades sociais; os índices de pobreza; os desequilíbrios e os ódios, principalmente os ódios, pequeninos e mesquinhos, entre as ilhas; o peso excessivo da administração pública no emprego, associado à ausência de alternância democrática. Tudo isto são problemas crónicos, que já vêm de décadas, que continuaram em 2019 e que se vão perpetuar em 2020. 
Agora, indo às questões mais concretas, há, obviamente, assuntos que forçosamente terão que ter alguma evolução em 2020. À cabeça, o dossier SATA. O governo não pode correr o risco de viver um ano eleitoral sem que o problema da SATA esteja resolvido ou, pelo menos, contido. Veremos se isso será possível e se sim com que consequências, para a empresa e para os Açores e os açorianos. No plano económico há também grandes incertezas quanto ao comportamento do sector do turismo, por exemplo, uma área altamente sensível e que neste governo tem sido confrangedoramente maltratado. O Turismo tem sido a alavanca da nossa economia e é um sector fortemente dependente de dois vectores: a qualificação da oferta do Destino, onde pouco ou nada foi feito, e a promoção externa do Destino. Ora, o actual governo entregou totalmente na mão dos privados o importantíssimo dossier da promoção, ao que acresce o facto de essa alteração ter demorado cerca de três anos e veremos se não vamos começar a sentir já os efeitos perniciosos desses três anos de total ausência de uma estratégia efectiva e eficiente de promoção turística. 
Quanto aos casos de justiça, esperamos que 2020 traga finalmente alguma conclusão aos incontáveis casos que assolaram a política regional nos últimos anos. O caso Gaudêncio, a operação Asclépio, a ATA, a SPRHI, e outros que possam ainda surgir, podem vir a ter um impacto imprevisível na política regional. Embora, o estado depauperado em que se encontra o Ministério Público na região nos leve a crer que dificilmente se poderão esperar grandes desenvolvimentos. Este é, aliás, um gravíssimo problema, que deveria provocar um profundo sobressalto social nos cidadãos e nos políticos em particular, são eles os maiores prejudicados com o eternizar de suspeitas e a indefinição destas acusações. Este é um problema que corrói a nossa democracia, que envenena a confiança dos cidadãos nos governantes e que devia, realmente, merecer a maior atenção de todos. E não é com promessas vãs de delações premiadas que se resolve o problema. É dotando o Ministério Público e as instituições judiciais com meios, técnicos e humanos, que estes casos podem ser resolvidos de forma célere e independente, doa a quem doer.

> 2 - As eleições regionais são acontecimento incontornável neste 2020. Qual a sua percepção em termos de estratégias dos partidos e da mobilização dos eleitores?

No meu entender, as grandes questões que se vão colocar nas eleições regionais de 2020 são a maioria absoluta e a abstenção. O resto são minudencias. 
O principal objectivo do PS-Açores é manter a sua maioria absoluta e para isso vai usar todas as armas ao seu alcance, começando, obviamente, pela máquina governativa e, por essa autêntica fonte da eterna juventude, que é a gestão dos fundos europeus. Derramar o elixir dos euros sobre as ilhas é meio caminho andado para as vitórias eleitorais. Resta saber, se isso será suficiente para fazer esquecer o óbvio desgaste que o partido e a governação sofrem neste momento junto do eleitorado. A imagem política de Vasco Cordeiro, que é visto ainda como um homem-bom, sofre uma clara erosão com a arrogância, a prepotência e, em muitos casos, a incompetência dos quadros superiores e intermédios de que se rodeou no governo e no partido. Aliás, a própria mobilização do partido vai estar marcada pela percepção que for possível fazer, pelos militantes, sobre o pós-Vasco Cordeiro. E, não creio que a ideia que se parece estar a estabelecer de que o putativo sucessor de Vasco Cordeiro possa vir a ser Francisco César augure um grande futuro para o Partido Socialista açoriano. É nesse jogo de percepções que se vai apostar a possibilidade, ou não, de uma maioria absoluta para o PS-A. 
Do lado do PSD, o grande desafio é convencer os eleitores de que é, de facto, possível tirar a maioria ao PS, sem que com isso os Açores caiam em qualquer espécie de caos ou de pântano. O PSD-A tem que convencer um eleitorado tendencialmente conservador e atreito a grandes mudanças, atávico até, diria eu, de que é possível fazer essa mudança de uma forma ponderada e construtiva. É quase como se o verdadeiro adversário do PSD não fosse o Governo e o PS, mas antes esse excessivo conservadorismo do próprio eleitorado açoriano. Se Bolieiro conseguir fazer passar a mensagem de que, ganhando ele ou não, a era do PS já chegou ao fim, pelos próprios erros do PS, aliás, então sim poderemos ter uma surpresa lá para Outubro. Se não, basta ao PS-A agitar a figura imponente de Vasco Cordeiro para garantir uma vitória nas eleições. 
A segunda questão é, de facto, a abstenção. Os Açores, com os níveis repetidos de abstenção que tem tido, caminham, a passos largos, para não serem uma verdadeira democracia. Quando as eleições são ganhas com a manipulação de uns quantos votos, em meia dúzia de freguesias chave, quase ao jeito de sindicatos de votos, então não são realmente democráticas. E não podemos deixar que este cenário cresça ou, sequer, que continue. Na minha opinião, em todas as freguesias em que a taxa de abstenção seja superior a cinquenta porcento, as eleições deviam ser repetidas. Obrigando-se assim os partidos a um maior esforço de clarificação e mobilização dos eleitores e, por seu lado, os eleitores a um maior compromisso com a democracia e a governação. Para além, claro, da abertura da Assembleia Legislativa Regional à candidatura de listas de cidadãos, mas isso, na nossa presente partidocracia parece-me mais ou menos impossível, infelizmente. 
De qualquer modo, pelo menos para os comentadores, 2020 vai ser um ano rico em matéria prima.



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