quinta-feira, 31 de dezembro de 2020

Café Royal CCVII

Do Futuro

Diz-me que isto é o futuro, / não acreditarei em ti.”, escreveu Louise Glück. Tal como o tempo o futuro morre em cada segundo que passa. Shakespeare, o inventor do humano, na formulação luminosa de Bloom, explicou que “o futuro não se encontra nas estrelas, mas em nós próprios”. É no presente que o futuro se fabrica, dia após dia, ininterruptamente. E, “o futuro é tão incerto como o presente” cantou Whitman, enquanto cofiava vagarosamente a espessa barba e olhava cintilante o Universo em cada folha de relva. Já Kierkegaard, jovem rapaz existencialista, ensinou-nos que “a vida só pode ser compreendida se olharmos para trás, mas deve ser vivida seguindo em frente”. Ao que Pessoa, depois de um desassossegado bagaço, retorquiu, “Vivo sempre no presente. O futuro, não o conheço. O passado, já não o tenho.” Mas, o que é o presente se não uma fugaz memória do que passou e anseio esperançoso e angustiado do que virá? Que futuro encontraremos amanhã que não seja, já hoje, uma levíssima cinza do passado, flutuando, suspensa, na brisa languida do presente? Só o sonho, ou o amor, sobrevivem às horas e às estações e ao Universo que se expande, negro, infinito e absoluto. Só no sonho e no amor o futuro existe, verdadeiramente…  

in Açoriano Oriental

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